O direito e a eutanásia: autonomia, dignidade e o testamento vital

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24/04/2024 às 17:33
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Resumo: Este artigo apresenta uma revisão sistemática da literatura que explora a complexa relação entre eutanásia, dignidade humana, morte e testamento vital. A eutanásia é um tema polêmico e desafiador, levantando questões éticas profundas sobre a autonomia do paciente e o respeito à sua dignidade no processo de tomada de decisões médicas no fim da vida. Por outro lado, o testamento vital surge como uma ferramenta legal que permite às pessoas expressarem suas preferências de tratamento e cuidados em situações de incapacidade, assegurando que suas vontades sejam respeitadas. É necessário realizar pesquisas abrangentes para compreender a relação entre esses temas em diferentes contextos culturais e jurídicos, considerando-se os diversos fatores influenciadores, como cultura, religião, ética, moral e legislação local. A discussão em torno da eutanásia requer uma abordagem cuidadosa, reflexiva e atenta aos princípios éticos e valores envolvidos, a fim de promover um diálogo informado e respeitoso sobre o assunto.

Palavras-chave: Eutanásia, Testamento vital, Morte digna, Autonomia, Dignidade humana.


INTRODUÇÃO

A proposta do presente artigo visa discutir a legalização da eutanásia no território brasileiro, tema este que se refere ao direito que visa a legalização para a prática da eutanásia, defendendo a sua autonomia, dignidade e a amplitude do testamento vital, sendo um assunto muito polêmico e pouco debatido, considerada crime no Brasil, a discussão sobre a legalização da prática tem crescido muito ao longo dos anos. Estamos diante de um tema complexo, pois envolve questões éticas, religiosas e morais. No entanto, argumentos são levantados, pois, em certas circunstâncias, esta prática pode ser vista como uma escolha legítima e humana para acabar com o sofrimento físico e emocional de uma pessoa.

É importante que os indivíduos tenham o direito de tomar decisões informadas sobre a sua própria saúde e bem-estar, sendo primordial a discussão e a reflexão sobre a finitude da vida e o direito de escolher o próprio caminho, tornando-as fundamentais para a promoção da autonomia individual e do respeito pela dignidade humana, pois, falar sobre eutanásia requer uma reflexão sobre a morte, para algumas pessoas, a cultura em torno da finitude é inadmissível, e são medidas tomadas para lutar contra, como a distanásia, que têm como objetivo, o prolongamento exagerado da morte. Já para outras, a morte pode ser vista como um alívio ou até mesmo um desejo. O medo da morte é universal e tem sido objeto de inúmeras pesquisas ao longo da história.

No entanto, a morte é uma condição inconvertível e não podemos fugir da realidade que nos cerca. Aceitar a morte é entender o verdadeiro significado da vida, o que há de mais humano. A finitude nos leva a refletir sobre o sentido da vida, para aonde vamos e qual é o nosso propósito aqui.

O testamento vital, é uma reflexão importante que pode levar as pessoas a considerarem seus desejos e preferências em relação a como desejam viver e morrer, tornando-a uma ferramenta importante que permite expressar os desejos de tratamentos médicos e cuidados no final da vida, incluindo a decisão de recusar tratamentos que a prolonguem desnecessariamente. Quando uma pessoa enfrenta condições de saúde incapacitante e incurável que comprometem significativamente sua qualidade de vida, é compreensível que ela considere a possibilidade de optar pela eutanásia, para acabar com seu sofrimento e ter uma morte digna e pacífica. Nesse sentido, é importante que a Constituição brasileira e as leis sejam discutidas para contemplar essas questões e estabelecer regras claras para garantir o direito de autonomia, a amplitude do testamento vital, e proporcionar dignidade de morte ao paciente.


1. CONCEITO

1.1. FINITUDE

O conceito de finitude é usado em diversas áreas do conhecimento como a filosofia, ciência e matemática, e é compreendida como a condição de ser finito, algo determinado, ou seja, ter limites ou ser limitado em termos de tempo, espaço, quantidade, alcance ou capacidade e pode ser aplicada em qualquer coisa que tenha existência definida.

Um exemplo são os seres humanos, que têm, não só o tempo de vida limitado, como também, o espaço físico que ocupa e a sua capacidade cognitiva. Na filosofia, a finitude é usada para descrever limitações da existência humana como a mortalidade, capacidade e conhecimento, sendo ela então um dos definidores da experiência humana e da compreensão do mundo e do nosso lugar nele. (MANNIX, 2019)

O ser-humano diferencia-se de outras espécies por ser munido de consciência o que possibilita a criação de símbolos, sendo assim, a morte passa a ser um acontecimento com dimensões religiosas, filosóficas e antropológicas, deixando de ser apenas um evento biológico, a morte de acordo com a cultura e características únicas de cada ser, pode ser vista de maneiras diferentes, mais ou menos negativas. (MACHADO; LIMA; SILVA; MONTEIRO; ROCHA, 2016)

Anteriormente a ideia de “boa morte” envolvia a presença de familiares e pessoas próximas e ocorria nas residências, como uma forma de suavizar, possibilitando a existência de uma despedida. Atualmente na sociedade a morte passa a ocorrer na grande maioria em ambientes hospitalares, deixando de ser habitual e familiar. Com a evolução da tecnologia, avanços da medicina e aumento da expectativa de vida, criou-se na sociedade uma falsa crença de imortalidade e de controle que seria proporcionado por esse ambiente. Havendo a mitologização da morte não permitindo que essa ocorra de maneira natural, negligenciando os desejos dos pacientes. (MACHADO; LIMA; SILVA; MONTEIRO; ROCHA, 2016)

Segundo o Filósofo Heidegger (1927) “Morrer não é um acontecimento; é um fenômeno a ser compreendido existencialmente”. Para a Dra. Kathryn Mannix, mesmo que a imortalidade seja estudada e almejada por muitos, não lhe parece muito convidativa, pois há certeza de que a cada dia chegamos mais perto da morte e de certa forma a torna uma dádiva a ser experiência. (MANNIX, 2019)

A partir disso podemos presumir que a morte não só deve ser vivida como também experiência, fazendo parte da relação do ser com o mundo e o fornecendo uma relação real com esse “Eu” finito e em constante transformação.


2. EUTANÁSIA

2.1. ETIMOLOGIA

A etimologia da palavra “eutanásia” vem do grego tânatus, que significa: “morte” e da palavra “eu” que significa: “boa” Nesse sentido pressupõe que a tradução etimológica da palavra eutanásia, traz em seu significado a definição do que seria uma morte-boa ou morte sem dor. (EUTANÁSIA, 2023)

O termo “Eutanásia” foi oferecido em 1623 por um dos filósofos empiristas da época e cientista chamado Francis Bacon, ele defendia a busca do conhecimento empírico e a aplicação da razão na tomada de decisões, incluindo questões éticas. A posição de Bacon em relação à eutanásia, portanto, poderia ser inferida a partir de sua filosofia geral, que traz uma expressão muita das vezes usada em contextos completamente diferentes, defronte dos desmembramentos bioéticos e jurídicos (BACON, 1712)

No século XVII, Francis Bacon defendeu a eutanásia como uma opção de "morte doce e pacífica" para pacientes, ressaltando a importância da intervenção médica. O termo "eutanásia" foi usado pela primeira vez por Bacon no século XVIII em sua obra "História vitae et mortis", promovendo a ideia de que a eutanásia poderia ser uma solução eficaz para doenças incuráveis na época. Ele apoiava a realização desse procedimento somente por médicos, quando todos os outros tratamentos já tivessem sido esgotados. (BACON,1712)

Em “O progresso do conhecimento”, assim escreve:

Mais ainda, estimo ser ofício do médico não só restaurar a saúde, mas também mitigar a dor e os sofrimentos, e não só quando essa mitigação possa conduzir à recuperação, mas também quando se possa conseguir com ela um trânsito suave e fácil; pois não é pequena bendição essa Eutanásia que César Augusto desejava para si [...] Mas os médicos, ao contrário, têm quase por lei e religião seguir com o paciente depois de desesperançado, enquanto, a meu juízo, deveriam em vez disso estudar o modo e pôr os meios de facilitar e aliviar as dores e agonias da morte. (BACON, 2007, p. 175)

Acontece que essa não é a única perspectiva do significado de eutanásia, basicamente ela significa em seu contexto mais ético como a abreviação da vida de uma pessoa, a pedido desta por compaixão daquele que pratica tal conduta para dulcificar o processo de sua morte. (RODRIGUES, 2023)

Ela pode ser vista como uma forma de desistir do tratamento e da vida, quando não há opções de cuidados paliativos e de final de vida disponível. A oferta pode ajudar o paciente a lidar com a dor e o sofrimento decorrentes da doença, e permitir que ele morra de forma digna.

2.2. DEFINIÇÕES E INFLUÊNCIA POR FATORES COMO: A CULTURA, RELIGIÃO, ÉTICA E, MORAL

Algumas culturas e religiões podem permitir a eutanásia em circunstâncias limitadas, enquanto outras proíbem completamente a prática. A eutanásia também pode ser vista como uma violação dos princípios éticos e morais, como o respeito à vida humana e à dignidade do paciente. A prática é legal em apenas alguns países e continua sendo um tema controverso em todo o mundo.

Bacon (1927) foi um dos precursores em defender e procurar a definição da eutanásia. No entanto, há evidências de que culturas antigas, como o Cristianismo, praticaram formas de eutanásia ou morte assistida. Um exemplo disso é a história de Saul na Bíblia, em que um amalecita relata ter matado Saul por compaixão, a pedido do mesmo para que não fosse capturado e humilhado pelos seus inimigos Filisteus, o que pode ser interpretado como uma forma de morte assistida. (BIBLIA SAGRADA, 1969)

O cristianismo tem uma forte influência na questão da eutanásia, uma vez que muitos cristãos veem a vida como um dom sagrado de Deus e acreditam que somente Ele tem o direito de decidir quando ela deve terminar. A eutanásia, que envolve a escolha deliberada de acabar com a vida de uma pessoa, pode ser vista como uma violação deste princípio. Além disso, muitos cristãos acreditam que o sofrimento humano pode ter um propósito e que é possível encontrar significado e redenção em meio à dor e ao sofrimento. Nesse sentido, a eutanásia pode ser vista como uma tentativa de evitar a dor e o sofrimento, sem permitir que a pessoa em questão possa ter a oportunidade de encontrar significado ou propósito em sua situação. (MASCARENHAS; GONÇALVES, 2016)

Para Martin Heidegger (1889-1976) o mesmo não segue uma linha empirista como Francis Bacon, mas sim uma defesa seguindo a linha estoica e platóica, defendendo o processo da vida até a chegada da sua morte, e traz em seu entendimento a consciência que tudo faz parte da experiência humana, e negligenciar esse processo, ou alterar, ou até mesmo não dulcificar o processo da finitude seria uma atitude negacionista a si mesmo. (SARTRE, 1998)

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Na Índia, algumas pessoas consideradas incuráveis são jogadas no rio Ganges após terem suas bocas e narinas vedadas com lama sagrada, em um ritual chamado "Jal Samadhi". Acredita-se que isso libera suas almas do ciclo de reencarnação. Já os espartanos, conforme relatado por Plutarco em Vidas Paralelas, jogavam recém-nascidos deformados e até mesmo idosos do alto do monte Taijeto, pois acreditavam que somente os filhos mais robustos e fortes poderiam se tornar guerreiros. Embora as práticas culturais antigas sejam interessantes de se observar, são atualmente consideradas desumanas e violam os direitos humanos básicos. É importante lembrar que as normas éticas e legais atuais protegem os direitos e a dignidade de todas as pessoas, independentemente de sua origem ou cultura. (LEÃO, 2012)

Para Adaister (2018), a eutanásia se torna uma imoralidade por defender o princípio sobre a vida ser valiosa e, que a sua prática seria um vilipêndio à vida humana, que não se torna por convencido ser uma prática moral, e achar a tese fraca de que o ser humano deve possuir essa autonomia, pois cai por terra quando de fronte se analisa as leis de proteção e preservação a vida, como se refere a elas nos seguintes termos.

Escolher de uma maneira que respeite todas essas perfeições humanas, tanto em nós como nos outros, é respeitar as pessoas humanas e escolher moralmente bem. Se a vida é intrinsecamente valiosa é sempre ruim destruí-la, se agirmos a fim de destruir algo que é intrinsecamente bom, então, estamos agindo de maneira errada. (ADAISTER, 2018)

Poderíamos até levantar o questionamento do que é moral em definição por matar ou deixar morrer, e mediante a cada análise, torna-se particularmente impetuoso definir a moralidade no que se diz respeito dos métodos de aplicação da Eutanásia, sendo que pela pluralidade cultural, religiosa e suas diversidades, cada indivíduo deve ter o entendimento e o direito de definir para si o que de melhor, diz a respeito de sua vivência.


3. TIPOLOGIA

3.1. EUTANÁSIA

A eutanásia é o ato de abreviar intencionalmente a vida de um paciente que está em estado terminal ou sofrendo de uma doença incurável e dolorosa, com o objetivo de aliviar seu sofrimento e dor. Os procedimentos para a realização da eutanásia podem incluir a administração de medicamentos, a retirada de suporte vital ou outras medidas que possam abreviar a vida do paciente

Roberto Dias traz em sua defesa o seguinte entendimento sobre a Eutanásia:

[...] eutanásia deve ser entendida como o comportamento médico que antecipa ou não adia a morte de uma pessoa, por motivos humanitários, mediante requerimento expresso ou por vontade presumida – mas sempre em atenção aos interesses fundamentais – daquele que sofre uma enfermidade terminal incurável, lesão ou invalidez irreversível, que lhe cause sofrimentos insuportáveis, do ponto de vista físico ou moral, considerando sua própria noção de dignidade. (DIAS, 2012, p. 148)

O seu entendimento em relação à Eutanásia, é definida por um comportamento médico que antecipa ou não adia a morte, e deve ser realizado a manifestação de vontade visando sempre o interesse do bem-estar do acamado, trazendo para si sua própria noção de dignidade. (DIAS, 2012)

Considerando o vídeo “O QUE É EUTANÁSIA?”. Em seu vídeo a advogada Luciana Dadalto menciona o seguinte:

Os requisitos para a realização da Eutanásia, também são requisitos que variam de acordo com cada País, [...] Então, esse requisito de abreviação da vida não precisa ser para uma pessoa que tenha uma doença é um requisito que vai variar da Lei e não necessariamente do conceito da pratica. (DADALTO, 2019)

Luciana, traz em sua argumentação uma definição mais aprofundada em seu conceito e em seus fundamentos, sobre o direito expresso do indivíduo, como também do requisitos que podem variar de acordo com as Leis de cada País. Em linhas gerais, uma pessoa que por alguma razão não queira continuar mais vivendo, ela pedirá ajuda de terceiros para abreviar a sua vida. (DADALTO, 2019)

3.2. DISTANÁSIA

Distanásia é a prática médica de prolongar a vida de um paciente em estado terminal ou com uma condição incurável, utilizando tecnologias avançadas, os métodos utilizados na distanásia podem incluir a utilização de equipamentos de suporte vital, como ventiladores mecânicos e nutrição artificial, bem como procedimentos cirúrgicos invasivos e a administração de medicamentos que podem prolongar a vida do paciente, mas sem oferecer chances reais de recuperação ou de melhorar sua qualidade de vida. Maria Helena Diniz fala sobre sua visão a respeito da distanasia. Ela diz:

Trata-se do prolongamento exagerado da morte de um paciente terminal ou tratamento inútil. Não visa prolongar a vida, mas sim o processo da morte. Para Jean-Robert Debray, é o comportamento médico que consiste no uso de processos terapêuticos cujo efeito é mais nocivo do que o mal a curar, ou inútil, porque a cura é impossível, e o benefício esperado é menor que os inconvenientes previsíveis. (DINIZ, 2006)

Diniz, argumenta que é uma prática que viola o princípio da dignidade humana, já que não respeita a vontade do paciente em relação ao seu próprio tratamento e prolonga seu sofrimento de forma desnecessária. Ela defende a importância da autonomia do paciente e sua capacidade de tomar decisões informadas sobre sua própria saúde e tratamento, bem como a necessidade de se garantir uma morte digna e sem sofrimento excessivo. Diniz também destaca a importância dos cuidados paliativos, que podem aliviar a dor e o sofrimento do paciente e garantir uma melhor qualidade de vida durante seus últimos dias. (DINIZ, 2006)

O novo Código de Ética Médica brasileiro, em vigor desde abril de 2010, estabelece as normas e diretrizes para o exercício da medicina no Brasil. Ele aborda diversas questões éticas, incluindo a distanásia, sendo considerada uma prática contrária aos princípios éticos da medicina. (CONSELHO FEDERAL DE MEDICINA, 2010)

XXI - No processo de tomada de decisões profissionais, de acordo com seus ditames de consciência e as previsões legais, o médico aceitará as escolhas de seus pacientes, relativas aos procedimentos diagnósticos e terapêuticos por eles expressos, desde que adequadas ao caso e cientificamente reconhecidas.

XXII - Nas situações clínicas irreversíveis e terminais, o médico evitará a realização de procedimentos diagnósticos e terapêuticos desnecessários e propiciará aos pacientes sob sua atenção todos os cuidados paliativos apropriados.

O código médico enfatiza a importância de respeitar a autonomia do paciente, permitindo que ele tome decisões sobre sua própria saúde e bem-estar. Os médicos devem exercer sua profissão com liberdade e independência, sempre buscando o benefício do paciente. Além disso, destaca-se a necessidade de oferecer cuidados paliativos adequados aos pacientes em estágio terminal ou com doenças incuráveis.

3.4. ORTOTANÁSIA

Ao contrário da eutanásia, a ortotanásia busca respeitar a vontade do paciente e aliviar sua dor e sofrimento. O objetivo é garantir a dignidade do paciente em seus momentos finais de vida, proporcionando conforto e suporte emocional. Defronte as pesquisas ortotanásia busca proporcionar uma morte natural e digna para pacientes terminais ou em sofrimento insuportável, sem prolongar artificialmente o processo de morrer. Algumas das práticas mais comuns são a administração de medicamentos para alívio da dor, a oferta de cuidados paliativos e de suporte emocional e espiritual, além do respeito à vontade do paciente em relação aos tratamentos.

Seguindo a resolução CFM nº 1.805/2006 que diz o que seguinte:

Art. 1º É permitido ao médico limitar ou suspender procedimentos e tratamento que prolonguem a vida do doente, em fase terminal de enfermidade grave e incurável, respeitada a vontade da pessoa ou de seu representante legal.

§ 1º O médico tem a obrigação de esclarecer ao doente ou representante legal as modalidades terapêuticas adequadas para cada situação.

§ 2º A decisão referida no caput deve ser fundamentada e registrada no prontuário.

§ 3º É assegurado ao doente ou representante legal o direito de solicitar uma segunda opinião médica.

§ 4º Em se tratando de doente incapaz, ausente o representante legal, incumbirá ao médico decidir sobre as medidas mencionadas no caput deste artigo.

Art. 2º O doente continuará a receber todos os cuidados necessários para aliviar os sintomas que levam ao sofrimento, assegurada a assistência integral, o conforto físico, psíquico, social, espiritual, inclusive assegurando a ele o direito da alta hospitalar.

Art. 3º É vedado ao médico manter os procedimentos que asseguravam o funcionamento dos órgãos vitais, quando houver sido diagnosticada a morte encefálica em não doador de órgãos, tecidos e partes do corpo humano para fins de transplante, nos termos do disposto na Resolução CFM nº 1.489, de 21.08.97, na forma da Lei nº 9.434, de 04.02.97. Parágrafo único. A decisão mencionada no caput deve ser precedida de comunicação e esclarecimento sobre a morte encefálica ao representante legal do doente.

Art. 4º Esta resolução entrará em vigor na data de sua publicação, revogando-se as disposições em contrário.

Em resumo ela estabelece as regras para a prática da ortotanásia no Brasil, com o objetivo de garantir que essa abordagem seja realizada com ética e transparência, respeitando sempre a vontade do paciente e oferecendo-lhe conforto e dignidade em seus momentos finais de vida. (CONSELHO FEDERAL DE MEDICINA, 2010)

Maria Elisa Villas-Bôas (2008, p. 66) conceitua a ortotanásia da seguinte forma,

A ortotanásia tem seu nome proveniente dos radicais gregos: orthos (reto e correto) e thanatos (morte). Indica, então, a morte a seu tempo, correto, nem antes nem depois. Na ortotanásia, o médico não interfere no momento do desfecho letal, nem para antecipá-lo nem para adiá-lo. Diz-se que não há encurtamento do período vital, uma vez que já se encontra em inevitável esgotamento. Também não se recorre a medidas que, sem terem o condão de reverter o quadro terminal, apenas resultariam em prolongar o processo de sofrer e morrer para o paciente e sua família. Mantêm-se os cuidados básicos.

A ortotanásia é uma prática médica que busca garantir uma morte digna e natural para pacientes em estado terminal ou em sofrimento insuportável, sem prolongar desnecessariamente o processo de morrer. (VILLAS-BÔAS, 2006)

Essa abordagem se baseia nos princípios éticos da beneficência, não-maleficência, autonomia e justiça, e busca respeitar a vontade do paciente em relação aos tratamentos.

3.5. MISTANÁSIA

A mistanásia também conhecida como "obstinação terapêutica” é a prática de prolongar o sofrimento de um paciente em estado terminal, através da utilização de tratamentos médicos sem benefícios claros. Contrária aos princípios éticos da medicina, essa abordagem não respeita a dignidade do paciente e resulta em sofrimento desnecessário. É importante priorizar o cuidado paliativo e respeitar a vontade do paciente no final da vida.

Trazida em sentido ético, no âmbito da bioética brasileira, o percursor que conduziu foi o brasileiro chamado Márcio Fabri dos Anjos, Suas contribuições ajudaram a levantar questões cognitivas relacionadas à tomada de decisão informada, autonomia do paciente, valores individuais e princípios éticos. Esses pioneiros na área da bioética no Brasil abriram caminho para uma discussão mais aprofundada sobre a mistanásia e sua implicação ética na prática médica (PESSINI, 2021).

Assim também diz Clóvis Constantino (2020).

Evitar a mistanásia agora é mandatório; evitá-la sempre significará a tomada de consciência dos agentes públicos em estabelecer prioridades, como a saúde. Assistência humanitária, financiamento, gestão, valorização e valoração dos profissionais são boa parte do que se espera. Afinal, o cidadão que adoece não é uma máquina avariada que requer reparos; é um ser humano completo.

Dessa forma, é fundamental que os profissionais de saúde e a sociedade em geral estejam conscientes sobre a importância dos cuidados paliativos e do respeito à autonomia do paciente em situações de fim de vida, para evitar a prática da mistanásia e garantir uma morte digna e respeitosa.

Sobre o autor
Thiago Turno Vedovati

Olá! Sou um estudante de direito apaixonado por produzir artigos. Com 24 anos de idade, mergulho profundamente no estudo das leis, precedentes judiciais e teorias jurídicas, sempre em busca de expandir meu conhecimento e aprimorar minhas habilidades. Escrever artigos é minha paixão e minha forma de comunicar ideias complexas de maneira clara e persuasiva. Através da pesquisa minuciosa e da argumentação cuidadosa, busco contribuir para o entendimento e o debate de questões legais relevantes. Acredito no poder da escrita para promover mudanças e influenciar positivamente a sociedade. Por isso, dedico-me a produzir conteúdo que não apenas informe, mas também inspire reflexão e ação. Junte-se a mim nesta jornada de descoberta e exploração do mundo jurídico através da escrita

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

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